A 2ª Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 10ª Região - DF/TO Condenou a INSTITUIÇÃO ADVENTISTA CENTRAL BRASILEIRA DE EDUCAÇÃO E ASSISTÊNCIA SOCIAL a devolver dízimo de ex-empregada
O dízimo descontado do salário a título de “cumprimento de voto religioso” não encontra amparo legal. Por
este motivo, a 2ª Turma do TRT-10ª Região determinou a devolução dos
descontos feitos nos salários de ex-empregada do Instituto Adventista
Central Brasileiro de Educação. A funcionária assinou autorização para o
desconto.
Poder Judiciário
Justiça do Trabalho
Tribunal Regional do Trabalho - 10ª Região
Processo: 01181-2011-009-10-00-5-RO
Acórdão do(a) Exmo(a) Desembargador(a) Federal do Trabalho BRASILINO SANTOS RAMOS
Acórdão do(a) Exmo(a) Desembargador(a) Federal do Trabalho BRASILINO SANTOS RAMOS
Ementa:
1. DESCONTOS EFETUADOS NO SALÁRIO OBREIRO A TÍTULO DE DÍZIMO. AUSÊNCIA
DE PREVISÃO LEGAL. CONSTRANGIMENTO. ILICITUDE. DEVOLUÇÃO DEVIDA. Do teor
do art. 462 da CLT e da Súmula nº 342 do col. TST, depreende-se que os
descontos efetuados pela ré no salário da autora a título de dízimo são
ilícitos. Revela-se, ademais, que a autorização e solicitação foram
ofertadas com vício de consentimento, uma vez que em contexto de
subordinação à reclamada, além de que “em cumprimento ao voto religioso”
da demandante. Desse modo, devem os valores correspondentes serem
devolvidos.
2. Recurso ordinário conhecido e provido.
Relatório
A MM. 9.ª Vara do Trabalho de Brasília/DF, mediante a r. sentença a fls.
94/96 julgou improcedentes os pedidos formulados na inicial.
Interpõe recurso ordinário a reclamante. Almeja a devolução dos
descontos efetuados em sua remuneração (a fls. 100/102).
Embora regularmente intimada, a reclamada deixou de ofertar
contrarrazões (a fls. 104).
Manifestação do Ministério Público do Trabalho, na forma da certidão de
julgamento.
É o relatório.
Voto
1. ADMISSIBILIDADE
Preenchidos os pressupostos objetivos e subjetivos de admissibilidade,
conheço do apelo.
2. MÉRITO
A demandante, na inicial, alegou que, por todo o pacto laboral, a
demandada efetuava descontos na ordem de 10% (dez por cento) da sua
remuneração a título de dízimo. Sustentou que tal abatimento é indevido e
ilegal, já que, além de ter de suportá-lo, traduz-se em doação de
índole religiosa, desvinculada da relação laboral mantida com a
acionada. Pediu, assim, a respectiva restituição.
Em contestação, a ré aduziu que está ligada à Igreja Adventista do
Sétimo Dia e que parte de seus empregados, na condição de membros dessa
comunidade, solicitam prévia e expressamente e sem qualquer coação o
desconto salarial referente ao mencionado donativo. Referiu que nem
todos os membros requerem a aludida dedução, adiantando que a autora,
mesmo depois de ter autorizado o desconto na folha de pagamento, poderia
ter solicitado sua cessação. Disse que, assim, não feriu o princípio da
intangibilidade salarial.
O MM. Juízo a quo acolheu a tese defensiva, ante a “falta de indícios de
coação ou qualquer outro vício de consentimento da reclamante” (a fls.
95).
As razões recursais renovam o pleito de devolução dos descontos.
Assevera que a acionada não pode abater o valor relativo ao dízimo de
seu salário, já que vincula sua atividade religiosa com a de
empregadora. Sugere que a sua insurgência traduziria a automática perda
do posto de trabalho. Sinala que os descontos se dirigiam a todos os
empregados.
Nos termos do art. 462 da CLT, o qual contempla a intangibilidade
salarial, é vedado ao empregador efetuar desconto nos salários do
obreiro, salvo quando esse desconto advier de adiantamento, de
disposição de lei ou de convenção coletiva de trabalho.
Lado outro, a Súmula nº 342 do col. TST estabelece que os
Descontos salariais efetuados pelo empregador, com a autorização prévia e
por escrito do empregado, para ser integrado em planos de assistência
odontológica, médico-hospitalar, de seguro, de previdência privada, ou
de entidade cooperativa, cultural ou recreativo-associativa de seus
trabalhadores, em seu benefício e de seus dependentes, não afrontam o
disposto no art. 462 da CLT, salvo se ficar demonstrada a existência de
coação ou de outro defeito que vicie o ato jurídico.
No caso concreto, observa-se que a reclamante professava a mesma fé
religiosa da mantenedora do colégio em que ela trabalhava.
Percebe-se, também, que consta solicitação e autorização da obreira para
que se proceda ao desconto concernente ao dízimo, a fls. 89, documento o
qual não foi impugnado pela recorrente.
Apesar disso, verifica-se que os abatimentos levados a efeito não
condizem com nenhuma das autorizações previstas no caput do art. 462 da
CLT. Nem se relacionam àquelas delineadas no conteúdo do enunciado
sumular referido.
Diga-se, também, não se poder considerar que a autorização e solicitação
tenham se dado sem maiores constrangimentos. Isso porque realizada em
contexto de contrato de trabalho, por meio do qual a autora se
encontrava em subordinação à reclamada.
Fosse suficiente, o documento a fls. 89 foi emitido em 1º/9/2007, dia em
que a obreira ingressou nos quadros da ré (a fls. 11). Nota-se,
outrossim, do teor daquele documento que a “contribuição” se dava “em
cumprimento ao voto religioso” da demandante. Infere-se que a
contratação estava condicionada à “doação” à Igreja.
Ilícitos, portanto, os descontos.
Consoante esse entendimento, vejam-se os seguintes arestos:
EMENTA: DÍZIMO. DESCONTO EM FOLHA. ILÍCITO. O contrato de trabalho e a
convicção religiosa não se misturam. Enquanto o primeiro se sujeita ao
mandamento legal, a segunda rege-se pela fé. O desconto sob a rubrica
'dízimo' não se encontra autorizado pelo art. 462 da CLT. A devolução é
medida que se impõe. (TRT2ªR, RO-02042200731102007, Relator
Desembargador Rovirso A. Boldo, Ac. 8ª T, publicado em 31/08/2007.)
EMENTA: Desconto Salarial em Folha. Donativo - Dízimo. Autorização
concedida durante a vigência contratual, em que a empregada se encontra
em estado de subordinação, não detém a espontaneidade necessária para
legitimar a oferenda de donativo - Inteligência do preceituado no caput e
§ 4º do artigo 462 da CLT. (TRT/15ªR, RO-0030200-07.2006.5.15.0076,
Relatora Juíza Tereza Aparecida Asta Gemignani, Ac. 1ª T., 1ª Câmara,
publicado em 31/8/2007.)
Dessa maneira, sob pena de restar violado o caput e o § 4º do art. 462
da Norma Consolidada, a r. sentença merece reforma, a fim de que a
reclamada seja compelida à devolução dos descontos efetuados no salário
obreiro a título de dízimo, observando-se os recibos de pagamento
acostados aos autos.
Dou provimento.
CONCLUSÃO
Ante o exposto, conheço do recurso e, no mérito, dou-lhe provimento para
condenar a reclamada a restituir os descontos efetuados no salário
obreiro a título de dízimo, devendo ser observados os recibos de
pagamento acostados aos autos.
A parcela ostenta natureza salarial (art. 832, §3.º, da CLT), devendo a
reclamada proceder ao recolhimento da contribuição previdenciária.
Comprovados os recolhimentos, autoriza-se a dedução do crédito da
reclamante os valores correspondentes à cota por ela devida, respeitados
os percentuais e o teto de contribuição, conforme art. 198 do Decreto
n.º 3.048/1999.
Incide, também, imposto de renda, que será calculado na forma das
instruções normativas e da legislação vigente à época da execução do
julgado. A reclamada comprovará também tais recolhimentos nos autos.
Incidência de correção monetária a partir do 1.º dia útil do mês
subsequente ao mês da prestação de serviços (Súmula n.º 381 do col.
TST).
Juros moratórios na forma simples, a partir do ingresso da presente
ação.
Inverto o ônus da sucumbência e arbitro o valor da condenação em
R$4.000,00(quatro mil reais) e fixo as custas processuais, a cargo da
acionada, em R$80,00(oitenta reais).
Diante da irregularidade constatada, e tendo em conta que a aludida
prática patronal é reiterada e aplicada a todos os empregados, expeça-se
ofício ao Ministério Público do Trabalho, com cópia da presente
decisão, para as providências que julgar necessárias.
Tudo nos termos da fundamentação.
É o voto.
Acórdão
ACORDAM
os integrantes da Segunda Turma do Tribunal Regional do Trabalho da
10.ª Região, conforme certidão de julgamento a fls. retro, aprovar o
relatório, conhecer do recurso e, no mérito, dar-lhe provimento para
condenar a reclamada a restituir os descontos efetuados no salário
obreiro a título de dízimo, devendo ser observados os recibos de
pagamento acostados aos autos. A parcela ostenta natureza salarial (art.
832, §3.º, da CLT), devendo a reclamada proceder ao recolhimento da
contribuição previdenciária. Comprovados os recolhimentos, autoriza-se a
dedução do crédito da reclamante os valores correspondentes à cota por
ela devida, respeitados os percentuais e o teto de contribuição,
conforme art. 198 do Decreto n.º 3.048/1999. Incide, também, imposto de
renda, que será calculado na forma das instruções normativas e da
legislação vigente à época da execução do julgado. A reclamada
comprovará também tais recolhimentos nos autos. Incidência de correção
monetária a partir do 1.º dia útil do mês subsequente ao mês da
prestação de serviços (Súmula n.º 381 do col. TST). Juros moratórios na
forma simples, a partir do ingresso da presente ação. Inverte-se o ônus
da sucumbência e arbitra-se o valor da condenação em R$4.000,00(quatro
mil reais), fixando-se as custas processuais, a cargo da acionada, em
R$80,00(oitenta reais). Diante da irregularidade constatada, e tendo em
conta que a aludida prática patronal é reiterada e aplicada a todos os
empregados, expeça-se ofício ao Ministério Público do Trabalho, com
cópia da presente decisão, para as providências que julgar necessárias.
Tudo nos termos do voto do Desembargador Relator.
Brasília (DF),21 de março de 2012(data do julgamento).
BRASILINO SANTOS RAMOS
Desembargador Relator
Certidão(ões)
Órgão Julgador: | 2ª Turma | ||||||||||||
8ª Sessão Ordinária do dia 21/03/2012 | |||||||||||||
Presidente: | Desembargador ALEXANDRE NERY DE OLIVEIRA | ||||||||||||
Relator: | Desembargador BRASILINO SANTOS RAMOS | ||||||||||||
Composição: | |||||||||||||
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aprovar o relatório, conhecer do recurso e, no mérito, por
maioria, dar-lhe provimento para condenar a reclamada a
restituir os descontos efetuados no salário obreiro a
título de dízimo, devendo ser observados os recibos de
pagamento acostados aos autos. A parcela ostenta natureza
salarial (art. 832, §3.º, da CLT), devendo a reclamada
proceder ao recolhimento da contribuição previdenciária.
Comprovados os recolhimentos, autoriza-se a dedução do
crédito da reclamante os valores correspondentes à cota por
ela devida, respeitados os percentuais e o teto de
contribuição, conforme art. 198 do Decreto n.º 3.048/1999.
Incide, também, imposto de renda, que será calculado na
forma das instruções normativas e da legislação vigente à
época da execução do julgado. A reclamada comprovará também
tais recolhimentos nos autos. Incidência de correção
monetária a partir do 1.º dia útil do mês subsequente ao
mês da prestação de serviços (Súmula n.º 381 do col. TST).
Juros moratórios na forma simples, a partir do ingresso da
presente ação. Inverter o ônus da sucumbência e arbitrar o
valor da condenação em R$ 4.000,00 (quatro mil reais),
fixando as custas processuais, a cargo da acionada, em R$
80,00 (oitenta reais). Diante da irregularidade constatada,
e tendo em conta que a aludida prática patronal é reiterada
e aplicada a todos os empregados, expeça-se ofício ao
Ministério Público do Trabalho, com cópia da presente
decisão, para as providências que julgar necessárias, tudo
nos termos do voto do Desembargador Relator. Vencido o
Desembargador Alexandre Nery de Oliveira que lhe negava
provimento, nos termos do voto que fará juntar. Obs.: O
representante do Ministério Público do Trabalho opinou pelo
prosseguimento do recurso.
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Fonte: www.trt10.jus.br/ |
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